quinta-feira, 30 de abril de 2015

fim de festa

aos poucos, o corpo vai começando a se desprender da pele e as lembranças começam a ocupar um vazio quase inatingível. minha memória, que sempre foi muito violenta, começa a se parecer com o vento. movimenta-se lenta, em cor de chuva. chove lá fora, é verdade, mas chove sobretudo aqui dentro. torrencialmente. mas ainda assim, tenho a voz. consigo cantar de olhos fechados, quase inacreditável atingir algumas notas que tocam o céu tão cuidadosamente. às vezes falho, tem muito ar pra ser atravessado pela goela. preciso renascer. meus pés estão cansados. você consegue perceber? não aceito suas migalhas, nem sua meia dúzia de palavras trocadas, nem sua tristeza estampada num biscoito da sorte dentro de um metrô lotado em pleno baixo centro. 
eu não conseguiria jamais traduzir tudo que inunda aqui dentro em palavras, mas só posso te dizer que chove. torrencialmente. espero de verdade que você esteja conseguindo comer as palavras que solta tão distraidamente, que seus olhinhos estejam se curvando menos diante da multidão, que você esteja conseguindo ver a luz do sol que tanto diz que procura. 
me desculpe, eu já não acredito mais em você. 
é preciso aceitar a incoerência dos fatos, é preciso morrer por alguns meses pra voltar a enxergar a primavera. a minha alegria ninguém tasca, nem mesmo a névoa que te corrói os ossos desde sempre. sinto muito pelo amor doado, sinto muito por ter acreditado tanto, talvez você nunca tenha estado diante de alguém que carrega o desejo visceralmente com as mãos, como alguém que carrega uma criança, um filho, uma aposta na esperança. a esperança é verde e cintilante e o desejo vai sempre continuar intacto, quase rasante a nos fazer carícias pelas cabeças e a nos encher de toda vida potente vibrante intensa imensa que há. 
vou te contar um segredo: você não sabe ainda o mal que eu te causei. i am so sorry, my love, fomos tudo que não precisamos. já é tarde, recolha suas roupas, keep going straight. the party is over.

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